Cumprindo a decisão do Judiciário que transitou em julgado publicada no dia 2 de outubro, o Conselho Federal de Medicina divulgou em seu site a anulação do Parecer nº 003/2017, assim como do artigo 9º, inciso VIII, da Resolução nº 2.183/2018.
Ambos atos normativos permitiam que o médico do Trabalho utilizasse dados do prontuário do trabalhador para fundamentar contestação do Nexo Técnico Epidemiológico Previdenciário.
Antes de comentar sobre a deliberação que findou uma polêmica de anos, o médico do Trabalho e perito médico federal João Silvestre da Silva-Júnior lembra que o NTEP foi implantado em abril de 2007 como uma ferramenta que poderia ser utilizada pela perícia médica previdenciária para caracterização dos benefícios por incapacidade decorrentes de agravos relacionados ao trabalho.
A legislação deu oportunidade aos empregadores de encaminhar uma contestação ao INSS quanto à caracterização do benefício auxílio-doença acidentário (B91) por aplicação do NTEP. “O Parecer CFM nº 003/2017 e o inciso VIII do artigo 9º, parágrafo 1º da Resolução CFM nº 2.183/2018, consideravam que não existia infração ética do médico que se baseasse em dados do prontuário do trabalhador para construir a argumentação de contestação à aplicação do NTEP na caracterização do B91. O Ministério Público do Trabalho propôs uma Ação Civil Pública contra o CFM para a revogação destes dispositivos”, retomou.
Além de dar ganho de causa ao MPT, não cabendo mais recurso, a Justiça também determinou que o Conselho Federal de Medicina se abstenha de editar atos normativos que permitam o livre trânsito de informações contidas no prontuário dos trabalhadores/empregados/segurados pelo respectivo médico do Trabalho.
QUESTÃO ÉTICA
Vendo a decisão como acertada, Silva-Júnior pondera que o médico, especialista ou não em Medicina do Trabalho, não deve quebrar o sigilo médico-paciente fornecendo informações sobre o trabalhador a terceiros, sem que haja consentimento do mesmo.
“O uso de informações sigilosas que estão no prontuário pode ser interpretado pelo trabalhador como uma quebra de confiança por parte do médico que é responsável por zelar por sua saúde, qualidade de vida e bem-estar. Portanto, a decisão judicial também protege o médico do Trabalho de exercer seu ofício sem que haja qualquer dúvida por parte do coletivo dos trabalhadores de que a sua atuação é imparcial”, avalia.
Afirma ainda que, no seu entendimento, o médico do Trabalho tem duas oportunidades de informar à perícia a ausência de riscos ocupacionais responsáveis por desencadear ou agravar quadros incapacitantes sem fornecer dados sigilosos. A primeira oportunidade refere-se ao relatório que o trabalhador leva na perícia do INSS e que pode abranger informações que vão subsidiar o perito médico federal para a descaracterização do NTEP.
Outra chance, caso a perícia configure o benefício como espécie acidentária, é que o médico do Trabalho pode apoiar a empresa na argumentação da contestação considerando as informações de ausência de condições de risco no trabalho, baseadas em laudos ambientais, dados epidemiológicos, na vigilância em saúde do grupo de trabalhadores da empresa. “O médico do Trabalho pode usar dados epidemiológicos que demonstrem não haver diferença na frequência dos adoecimentos entre os trabalhadores expostos e não expostos a determinados riscos ocupacionais. Sugerindo, portanto, que o trabalho não influencia no processo de adoecimento e incapacidade”, complementa.
Representante da classe, a Associação Nacional de Medicina do Trabalho preferiu não comentar o assunto.
Fonte: Revista Proteção – por Raira Cardoso em 20/11/2020.
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