TST analisou alcance do sobrestamento determinado pelo STF, que pode alcançar mais da metade das ações trabalhistas
A Subseção de Dissídios Individuais 1 (SD-1) do Tribunal Superior do Trabalho (TST) decidiu, na última quinta-feira (10/10), pela ampla aplicação da decisão do ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal (STF), de suspender a tramitação de processos que tratam sobre negociação de direitos não previstos na Constituição.
A decisão foi tomada por oito votos a seis. Ministros demonstraram preocupação com os efeitos da decisão, que podem provocar uma paralisia da Justiça do Trabalho. Em julho, Gilmar determinou que sejam suspensos todos os processos que tratam sobre validade de norma coletiva de trabalho que limita ou restringe direito trabalhista não assegurado constitucionalmente.
A SDI-1 se dividiu entre aqueles que acham que a suspensão só abarca os temas citados pelo ministro do Supremo na decisão de sobrestamento, e aqueles que acreditam que abarca qualquer negociação coletiva entre funcionários e empregadores. Venceu a segunda corrente. De acordo com ministros, o sobrestamento pode atingir entre 50 a 60 porcento das ações da Justiça do Trabalho. A suspensão nacional já tem efeitos desde julho, mas esta foi a primeira vez que o TST discutiu seus efeitos.
A decisão foi tomada em uma questão de ordem em um recurso de revista que discutia a base de cálculo para pagamento de horas extras, negociada em acordo coletivo. Os ministros analisaram se o caso se encaixa ou não no sobrestamento determinado pelo STF. O JOTA apurou que o TST pode publicar uma instrução normativa para definir os critérios para sobrestamento.
O entendimento de sobrestar todos os processos que tratam sobre a negociação de direitos não garantidos na Constituição foi inaugurada pelo ministro Renato de Lacerda Paiva. Ele foi acompanhado pelos ministros Márcio Eurico Vitral, Augusto César Leite, Breno Medeiros, Maria Cristina Peduzzi, Alexandre Ramos, Alberto Bresciani e Brito Pereira.
“A suspensão nacional não pode ser considerada como adstrita a matéria menos abrangente ou particular àquela que identifica o tema de repercussão geral. O tema é a validade de norma coletiva que restringe direitos de natureza infraconstitucional, e não pode ter sua abrangência restrita pelos tribunais de origem”, disse o ministro Renato de Lacerda Paiva.
O ministro Cláudio Brandão, que suscitou a questão de ordem, foi o primeiro a votar pela aplicação restrita da decisão de Gilmar Mendes. Em sua visão, só devem ser sobrestados o casos relacionados aos temas citados no acórdão do STF que reconheceu a repercussão geral da matéria. Foi acompanhado pelos ministros Walmir Oliveira da Costa, Roberto Freire Pimenta, Hugo Scheuermann, Lélio Bentes e Vieira de Mello Filho.
Isso porque, ao decidir pela repercussão geral em abril, o plenário citou os temas 357 e 762 – que não tiveram repercussão geral reconhecida –que guardam relação com o caso concreto. O primeiro tema trata da redução do intervalo intrajornada e majoração da jornada de trabalho, no regime de turnos ininterruptos de revezamento, por negociação coletiva.
Já o segundo, discute a validade de norma coletiva de trabalho que fixa limite ao pagamento de horas in itinere inferior à metade do que seria devido em relação ao tempo efetivamente gasto pelo trabalhador no trajeto até o local do serviço. A repercussão geral e consequente sobrestamento foi definido no ARE 1.121.633. A ação trata da supressão do pagamento das horas in itinere – tempo de deslocamento entre a residência do funcionário e seu local de trabalho, quando de difícil acesso – em acordo coletivo, em troca de outros benefícios. O recurso envolve uma mineradora de Goiás. Quando foi reconhecida, por unanimidade, a repercussão geral do caso, a tese foi expandida.
Alguns ministros que acompanharam esta corrente fizeram críticas à abrangência da suspensão determinada pelo STF. Em longo voto, Vieira de Mello falou: “O STF estaria, por meio da repercussão geral, ultrapassando os limites de uma própria ação direta de inconstitucionalidade. Porque a questão do direito aí assumiria o contorno e a roupagem de um exame ou ativismo legislativo, porque estaria definindo o negociado sobre o legislado, não estaria definindo questões adstritas a uma questão direcionada”.
O ministro Freire Pimenta também fez críticas ao sobrestamento amplo pois vai gerar a uma “verdadeira paralisia da jurisdição trabalhista”. Em sua visão, “essa leitura ampliativa vai levar ao comprometimento da função constitucional e legal” do TST, “ainda que de forma temporária”. Vieira de Mello disse ainda que o sobrestamento do STF foi uma “extrapolação de limites” e uma interferência na Justiça do Trabalho. “Imagino uma questão que acabe com uma negociação, decotando direitos que implicam em saúde do trabalhador. Porque a norma coletiva disse que pode ou não pode isso ou aquilo, esse processo não poderá ser julgado”, falou. “Estamos cuidando de uma opção político-legislativo, que compete ao Poder Legislativo, definida pelo Judiciário em uma repercussão geral. Eu gostaria de deixar registrado que essa extrapolação dos limites nós vamos simplesmente chancelar uma intervenção na jurisdição trabalhista”.
Ao votar, o presidente do TST, ministro Brito Pereira, defendeu a competência do Supremo para fazer esse tipo de intervenção. “O critério de repercussão geral do STF é uma interferência mesmo, legal, processual, atribuída à competência da Suprema Corte para interferir na jurisdição, suspender o andamento de feitos que dependam de decisão definitiva e em caráter vinculante do STF. E quanto a isso devo declarar a minha absoluta resignação”, disse.
De acordo com dados do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), de julho até hoje, há 10.122 processos sobrestados relacionados ao tema 1.046 da repercussão geral, que discute a validade de norma coletiva de trabalho que limita ou restringe direito trabalhista não assegurado constitucionalmente. Destes, 4.377 estão no TST. O número tem aumentado a cada dia.
Para o advogado trabalhista Daniel Chiode, sócio do escritório Chiode Minicucci, é preciso que o STF julgue o tema com rapidez, pois nem empregadores nem empregados se beneficiam de um processo parado.”Se eu tenho dois, três cinco pedidos, e um deles é fundado em norma coletiva, eu paro o processo inteiro? Isso não é bom para as empresas e não é bom para o empregados. É importante que haja segurança jurídica, mas o processo parado para a empresa custa 1% ao mês, é importante que o STF julgue e julgue rápido este tema, porque não é bom para ninguém”, comenta.
O caso não tem previsão de ser julgado no mérito pelo STF, e sequer ganhou parecer da Procuradoria-Geral da República. A decisão do plenário sobre este processo tem o condão de reafirmar ou não um pilar da reforma trabalhista (Lei 13.467/2017) de Michel Temer, que determina que o negociado se sobrepõe ao legislado.
A decisão pode, inclusive, balizar o entendimento da Corte em ações que contestam dispositivos da reforma.
Fonte: Portal Jota – por Hyndara Freitas – em 11/10/2019
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